Domingos coloridos em Belém
Vem, morena,
vem ver Pavulagem na rua
tesouro escondido do mundo
no outro lado da rua.
Acordar,
antes das 9h, em um domingo parece ser um desafio para a maioria das pessoas
que acumulam cansaço durante os dias de semana. Mas os domingos de junho em
Belém nos motivam a levantar logo cedo e seguir para a escadinha da Estação das
Docas, ponto de concentração do Arraial do Pavulagem, que este ano celebra 30
anos de muito colorido na capital paraense.
O
cortejo, comandado pela banda, pelo boi azul, pelos pernas-de-pau do Batalhão
da Estrela e pelo batalhão das crianças, segue pela Avenida Presidente Vargas
rumo ao palco armado na Praça da República. Uma multidão acompanha: os
brincantes são crianças, adultos, jovens e idosos. O chapéu de palha coberto
por fitas coloridas é adereço indispensável (até mesmo pelo sol escaldante). A
cidade deixa de ser um simples conjunto de ruas, avenidas, prédios e praças, e
vira uma festa. O colorido toma conta não apenas da visualidade urbana, mas
também da alma. Como observa a pesquisadora Lucrécia D’Alessio Ferrara, “a
cidade está no âmbito das relações humanas, das trocas simbólicas, da interação
e da mediação”.
Foto: Dah Passos/Instituto Arraial do Pavulagem |
Para
o presidente do Instituto Arraial do Pavulagem, Ronaldo da Silva, o evento
representa um lugar de encontro para a capital paraense, onde as pessoas vivem em
intensa amizade e alegria, “acho muito legal quando as pessoas que moram fora e
as que moram aqui sentem essa alegria ao ouvirem falar do Arraial. Todos querem
participar das atividades, eu penso que pra cidade, nós somos um exemplo de
cidadania. Os cortejos celebram e transmitem a energia que as pessoas que
gostam do Pavulagem têm. E, com esses trinta anos, em meio a tantas
dificuldades, os cortejos trazem um sentido para nos reerguermos sempre, para
não deixar que essa brincadeira perca o rumo. Nossa expectativa segue
pelo caminho da alegria para todos nós”, comenta.
Durante
estas três décadas de existência, o Pavulagem movimenta a cidade, são domingos
em que empregos (grande parte indiretos) são gerados, são dias de encontro,
afeto e interação. “Sempre gostei de São João. Sempre vivi São João, seja na
escola, na rua de casa. Eu lembro que fui a primeira vez no Pavulagem pouco
antes de entrar na faculdade, acho que 2007, e me encantei de primeira. Depois,
como universitário, estar no Pavulagem era necessário, seja pra conseguir um
dinheirinho pra formatura ou uma viagem, ou beber com as amigas e amigos. As
lembranças são sempre de uma celebração muito feliz”, relembra o jornalista e
perna de pau do Batalhão da Estrela, Phillippe Sendas.
Com
a atual crise política e a própria crise nas relações humanas, as quais trazem
à nossa sociedade a violência e a falta de esperança, manter uma festa como a
do Arraial é incentivar os belenenses a reconhecerem a sua força nas ruas, “é
nessa mesma rua que a gente sofre com os desmandos do poder público e vive a
insegurança. O povo deve ocupá-la pra celebrar, que é uma forma de resistir, eu
acho. Além de ser um desafio estar lá, na perna de pau, seja pelo medo, seja
pelo cansaço, é muito bacana ver lá do alto a energia que tem as ruas de Belém,
especialmente nos domingos de junho. É tudo muito forte! E muito necessário pra
nossa cidade!", enfatiza Phillippe Sendas.
O
Instituto Arraial do Pavulagem, responsável pelo cortejo, é uma organização
autônoma da sociedade civil, sem fins lucrativos, criada em 2003. Ao longo de
sua existência, o Instituto tem desenvolvido ações de educação cultural na
Amazônia que contribuem para transmitir e fortalecer o saber oral tradicional,
com uma leitura contemporânea através de linguagens como a dança, a música e a
visualidade cênica. Em quase uma década de atividades, o Instituto coloca na
rua seus principais projetos: os cortejos de cultura popular Cordão do
Peixe-Boi (último domingo de março), Arrastão do Pavulagem (junho) e Arrastão
do Círio (outubro). Os cortejos somam-se a oficinas, palestras, seminários,
pesquisas, projetos de extensão, rodas cantadas, ensaios, mostras e shows, que
valorizam e propagam as manifestações artísticas da Amazônia.
Foto: Reginaldo Santos Conceição |
O
Arrastão do Pavulagem 2016 tem patrocínio da Oi, por meio da Lei Semear de
Incentivo à Cultura, do Governo do Pará. O Apoio cultural vem da Oi Futuro e
Prefeitura de Belém. O próximo arrastão será realizado neste domingo, 26 de
junho, e o último no dia 3 de julho. A concentração será a partir das 9h, na
escadinha da Estação das Docas.
Texto:
Camille Nascimento
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